quinta-feira, 7 de julho de 2011

Tico Santa Cruz, do Detonautas, fala sobre gravadora, internet e mais

Sempre presente na internet, Tico Santa Cruz e sua banda, Detonautas Rock Clube, disponibilizaram para download gratuito no Palco MP3 a nova música de trabalho, "O Inferno São Os Outros", desafiando as regras da indústria fonográfica.

Através do Twitter, Tico fez uma ampla divulgação da faixa, mostrando que o sucesso da mesma não dependia simplesmente das mídias convencionais.

Sobre esse e outros assuntos, o vocalista do Detonautas bateu um papo com o Cifra Club. Acompanhe a entrevista exclusiva abaixo:

Tico, você divulgou pela internet a nova música do Detonautas, "O Inferno São Os Outros" de forma bem independente e até mesmo sem apoio da gravadora (é a Sony, certo?). O que te motivou a fazer isso?

Tico: Na verdade me antecipei a gravadora não por desrespeito a eles que são meus parceiros, apenas pelos atrasos cometidos no lançamento que geraram uma série de percalços com os fãs que estavam esperando ansiosos pelo resultado tendo em vista que desde o primeiro momento quando pisei no estúdio para os ensaios, fui pela internet escrevendo na comunidade do Detonautas absolutamente tudo que estava se passando em tempo real. O lançamento previsto para o início de junho foi alterado para o final do mês, em seguida para início de julho e depois para agosto. Não acho que a banda e os fãs tenham de ficar nessa angústia por conta do Bloqueio de algumas rádios. A minha intervenção foi por conta da dificuldade que a gravadora esta tendo em receber abertura de certas rádios que hoje determinam o que toca ou não para o público em rede aberta.

No post que você publicou em seu Blog no dia 07/07, você afirmou que está "pronto para as retaliações da burocracia totalitária". Para você, qual seria o rumo que o mercado fonográfico deve tomar para sair desse tipo de pensamento classificado por você como "totalitário"?

Tico: A Burocracia Totalitária é aquela que senta numa cadeira para reuniões pensando exclusivamente em números, esquecendo que esses números se fazem com ações e estratégias que se adaptem ao contexto atual. Este contexto está completamente inserido dentro da internet que é o meio mais democrático, eficiente e importante, ainda que no Brasil a  maior parte da população não tenha acesso a rede. Ficar nas mãos dos interesses comerciais de alguns homens me angustia muito e sei que faço parte desse sistema e que em vários momentos compactuei com eles quando me interessou, mas o jogo é assim e quem não se enfia no meio não sabe exatamente como funciona e sem saber como funciona não sabe como pode mudar. A mudança é fundamental para que possamos nos adaptar a realidade e o modelo jurássico e engessado de rádios e gravadoras está perto do fim.

A sua gravadora chegou a se manifestar após a disponibilização da nova faixa pela internet?

Tico: 
Depois de alguns e-mails, liguei para o diretor artístico que é uma pessoa que tem a mente bem aberta para essas iniciativas e conversamos a respeito. Ele me entendeu e me garantiu que estaria do meu lado, até porque conhece minha personalidade e me apóia.

Seus colegas de banda apoiaram sua iniciativa?

Tico: 
Estamos todos no mesmo barco.

Você também baixa músicas, mesmo que não disponibilizadas "legalmente"?

Tico: 
Tem fases que baixo músicas, mas não sei quais são as que podem ser baixadas legalmente e quais não são. Não me sinto um criminoso por ter um conteúdo que somente eu esteja ouvindo  na minha casa sem fins lucrativos. Essa mentalidade é de quem ainda não entendeu que a rede é uma aliada e não uma inimiga e que os meios de se ganhar dinheiro apenas mudaram.  Cabe deixar claro que a produção de uma canção envolve muitos custos, muitos profissionais e muito empenho de quem se propôs a isso, mas quando você tem uma música popular entre as pessoas o seu show também se torna popular e conseqüentemente esse dinheiro circula, por conta disso abrimos mão do empresário e entregamos 20% do nosso faturamento de shows para a gravadora que agora não tem do reclamar com relação as contas que antes não batiam.

E o que acha dos fãs baixarem discografias completas?

Tico: 
Acho que as pessoas escolhem. Eu por exemplo gosto dos Cds, assim como tem quem goste de Vinil e quem goste de livros, cada um escolhe a maneira com que vai beber na fonte.

Sabemos que sua relação com a internet é íntima e intensa, e que você a usa bem para trabalhar também suas ideologias e fazer protestos. Você acredita que um dia a internet será capaz de fazer barulho suficiente ao ponto de incomodar significativamente as autoridades, ou realmente perdeu as esperanças, como havia comentado após o episódio do movimento contra José Sarney?

Tico: A internet pode ser um meio, mas não acredito que somente ações virtuais possam resolver problemas políticos. É importante que as pessoas não se transformem apenas em fotos e palavras em sites de relacionamentos. Precisamos de gente nas ruas, precisamos de mentes pensando e agindo no mundo o real. A internet pode unir essas pessoas, mas jamais podemos trocar o contato real pelo virtual. Sabemos que a violência, o medo e tantas outras questões nos afastam de nós mesmos e nos aprisionam em nossas telas de computador onde as pessoas fazem até sexo sem precisar de contato físico. Contudo nada substitui pessoas com pessoas, a meu ver.

Você é também um assíduo usuário do Twitter. Você vê a ferramenta como um simples espaço de expressão e conversação, ou considera o potencial do microblog maior? Como?

Tico: 
Posso dizer que minha existência virtual se divide entre antes de depois do Twitter agora é tentar usá-lo de modo que essas transformações possam ser levadas para o mundo de verdade. Se é que tudo isso aqui não seja um sonho e eu esteja aprisionado numa espécie de Matrix.

Se você tivesse hoje o poder de corrigir nossa legislação relacionada à direitos autorais e compartilhamento de músicas, o que você mudaria?
Tico: Os portais que oferecessem músicas gratuitas e com isso tivessem muitos acessos poderiam pagar os direitos autorias com base nos anunciantes  que suas páginas recebessem, todo mundo ganharia.

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